Você pode correr o Brasil de norte a sul e de leste a oeste,
do Oiapoque ao Chuí, como diriam os antigos leitores de “O Guri”, que não verá
nas ruas um único policial patrulhando as ruas, num país de alto índice de
criminalidade, roubos de celulares, de dinheiro (enfiam a mão nos bolsos da
vítima, como já aconteceu comigo inúmeras vezes), de bolsas e sacolas com as
compras feitas por moças e senhoras. Isso para não falar no grande número de
assassinatos, gratuitos ou motivados pelos mais variados motivos. Quando muito,
há um ou outro policial nas portas do Itaú e do Bradesco, os bancos
particulares semi-oficiais.
Todo governador que se empossa diz que botará a polícia para
trabalhar, levando-a para as ruas, a fim de proteger os cidadãos (?). As
pessoas acreditam, brasileiro é muito crédulo. Por alguns dias isto até
acontece. Dois, três dias. Logo em seguida a pm volta à sua modorra habitual.
Imagino que dorme o dia inteiro... Polícia aqui só motorizada, e olhe lá. Eles
dizem que policial a pé nas ruas (a única coisa que funciona, pelo seu caráter
dissuasório) é um alvo que convida a mira e o disparo dos bandidos. Então
colocam alguns poucos policiais em algumas poucas “viaturas” (como dizem),
param num ponto e ficam à espera de alguma ordem pelo rádio para se deslocarem
para algum lugar. De maneira que a coisa fica assim: se sou assaltado, devo
pedir ao assaltante que me faça o favor de esperar um instantinho, enquanto vou
ao orelhão mais próximo pedir a presença de uma “viatura”. Se o ladrão for
bonzinho, tiver bom coração, pode ser que ele se disponha a esperar a chegada
dos “homes” para efetuar o seu assalto.
Ah, ia me esquecendo. A polícia também bate, humilha,
tortura e mata (“Onde está Amarildo?”) em grande escala. Quando mata, o que é
freqüente, lavra os chamados autos de resistência para justificar o
assassinato, ou a execução, ou a aplicação da justiça por mãos próprias. No
Brasil existe pena de morte, decretada pela polícia militar. Todo mundo sabe
disto, mas ninguém faz absolutamente nada, confirmando o que venho dizendo, que
este país é um monte de merda. O supreminho faz alguma coisa? Nada! Ele está
ocupado em encadear as mais abstrusas e abstratas razões para colocar algum
figurão na rua, livre da cadeia, principalmente se for do petê, partido que
controla pelo menos a metade mais um de seu corpo de juízes. O Congresso até
que faz alguma coisa de vez em quando, no sentido de legalizar o óbvio, isto é,
a necessidade de extinguir este tipo de polícia, que brinca de Forças Armadas,
e é na verdade um corpo de segurança, para não dizer outra coisa, dos
governadores dos estados. Uma herança dos tempos coloniais, quando a
perversidade do colonizador português, o mais perverso de todos os
colonizadores, colocou esta turma para bater
paus na defesa dos capitães-generais.
Agora, se o povo vai para as ruas... ai, ai, ai..., eles
aparecem em verdadeira multidão para jogar bombas, bater cassetetes, jogar no
chão, chutar, ferir, cegar ou derramar sangue com balas de borracha, de espada
na mão lançar cavalos sobre o que supõem, acreditando no que os seus donos
disseram, ser o inimigo. Ainda outro dia mesmo, um soldado negro jogava esprei
de pimenta sobre os olhos de um manifestante também negro, em frente ao
supreminho.
Nós não somos o inimigo. Nós somos os donos deste território
que desbravamos com armas rudimentares, enfrentando rios caudalosos, serpentes,
onças, doenças tropicais e as setas dos índios, justificadamente, bravios. Mas
o Brasil não é o seu território. O Brasil somos nós e a nossa cultura. Os
judeus mantiveram, por dois milênios, longe de seu primitivo território, a sua
língua e a sua identidade nacional. O Brasil somos nós, repito, nós, o povo
brasileiro, desde o mais pilantra dos banqueiros até o mais humilde, o mais
faminto e nu dos favelados.
Mas é besteira ficar falando sobre isto. Isto aqui não tem
conserto, nem nunca terá.