segunda-feira, 30 de abril de 2012

RAPOSOS


PANEM NOSTRUM



Templo votivo
Sombrio e imóvel
Na tarde viva
Que a noite envolve.

Nave tardia
Transfigurada.
A tarde fria
Torna-a encantada.

As velas juntas
Parecem asas
Alanceadas.

Irmãs defuntas
Ressuscitadas
Por Deus chamadas.



Jorge de Lima
Livro de Sonetos

domingo, 29 de abril de 2012

NIKON


A BÍBLIA SAGRADA



Jacó se pôs a caminho e foi para a terra dos filhos do Oriente. E eis que viu um poço no campo, junto ao qual estavam deitados três rebanhos de ovelhas: era neste poço que se dava de beber aos rebanhos, mas a pedra que tapava a sua boca era grande. Quando todos os rebanhos estavam lá reunidos, removia-se a pedra da boca do poço, dava-se de beber aos rebanhos, depois recolocava-se a pedra no mesmo lugar, na boca do poço. Jacó perguntou aos pastores: “Meus irmãos, de onde sois vós?” E eles responderam: “Nós somos de Harã.” Eles lhes disse: “Conheceis Labão, filho de Nacor?” — “nós o conhecemos” responderam eles. Ele lhes perguntou: “Ele vai bem?” Respoderam: “Ele vai bem, e eis justamente sua filha Raquel que vem com o rebanho.” Jacó disse: “É ainda pleno dia, não é o momento de recolher o rebanho. Dai de beber aos animais e retornai à pastagem.” Mas eles responderam: “Não podemos fazê-lo antes que se reúnam todos os rebanhos e que se retire a pedra da boca do poço; então nós daremos de beber aos animais”.

Conversava ainda com eles quando chegou Raquel com o rebanho do seu pai, pois era pastora. Logo que Jacó viu Raquel, a filha de seu tio Labão, e o rebanho de seu tio Labão, aproximou-se, retirou a pedra da boca do poço e deu de beber ao rebanho de seu tio. Jacó deu um beijo em Raquel e depois caiu em soluços. Contou a Raquel que ele era parente de seu pai e filho de Rebeca, e ela correu para informar ao pai. Ouvindo que se tratava de Jacó, filho de sua irmã, Labão correu ao seu encontro, apertou-o em seus braços, cobriu-o de beijos e o conduziu para casa. E Jacó lhe contou toda essa história. Então Labão lhe disse: “Sim, tu és de meus ossos e de minha carne!” E Jacó ficou com ele um mês inteiro.


Gn 29, 1-14

sábado, 28 de abril de 2012

ENTRE RIOS DE MINAS


OS NOVOS INCONFIDENTES



 Os perseguidos pela ditadura resultante do golpe império-empresarial-católico-militar dee 1º de abril de 1964.

Publicação em homenagem à memória do Doutor Mílton Soares Campos.

SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS

Lauro Balduíno Theobaldo Schuch
Lauro Hagemann
Lauro Migliari
Lázaro Servo
Leo de Almeida Neves
Leo Guanabara
Leon Naves Barcelos
Leôncio Ferraz Júnior
Leonel de Moura Brizola
Leonel Júlio
Liberato Pereira da Costa Júnior
Lício da Silva Hauer
Lígia Moelmann Doutel de Andrade
Lincoln Cordeiro Oest
Lindolfo Silva
Lindonor Patriota do Nascimento
Lourdes Odette de Carvalho Bennaim
Lourival da Costa Villar
Luciano Campos de Magalhães
Lúcio Casanova Neto
Luiz Alberto Dalcanale
Luiz Alberto de Faria Espíndola
Luiz Augusto Sommer de Azambuja
Luiz Cardoso de Lemos
Luiz Carlos Janotti
Luiz Carlos Prestes
Luiz Cláudio Castro e Costa
Luiz da Costa Leal
Luiz da Silva Sampaio
Luiz de Andrade Lima
Luiz Fernando Bocayuva Cunha
Liz Geolás de Moura Carvalho
Luiz Gonzaga de Almeida
Luiz Gonzaga de Oliveira Leite
Luiz Gonzaga de Paiva Muniz
Luiz Gonzaga dos Santos
Luiz Gonzaga Malta Gaia
Luiz Gonzaga Moreira Coutinho
Luiz Guilhardini
Luiz Hugo Guimarães
Luiz Ignácio Maranhão Filho
Luiz Jovert Telles
Luiz Maria Ferraz
Luiz Portela de Carvalho
Luiz Roberto Tenório
Luiz Rodrigues Corvo
Luiz Tavares da Cunha Mello
Luiz Tenório de Lima
Luiz Thomas de Aquino
Luiz Viegas da Mota Lima
Lysâneas Dias Maciel 

SÃO JOÃO DEL REI


O QUE JESUS ENSINOU E OS CRISTÃOS REPUDIAM



Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se tornar insosso, com que o salgaremos? Para nada mais serve, senão para ser lançado fora e pisado pelos homens.

Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte. Nem se acende uma lâmpada e se coloca debaixo do alqueire, mas na luminária, e assim ela brilha para todos os que estão na casa. Brilhe do mesmo modo a vossa luz diante dos homens, para que, vendo as vossas boas obras, eles glorifiquem vosso Pai que está nos céus.


Mt 5, 13-16

sexta-feira, 27 de abril de 2012

OUTROS TEMPOS


GR


João Guimarães Rosa termina seu livro Grande Sertão: Veredas com a frase:

“O diabo não há! É o que eu digo... Existe é homem humano. Travessia.”

Ficou, então, no ar, desacompanhada de qualquer definição ou explicação, esta afirmação categórica de Riobaldo sobre o verdadeiramente existente: “existe o homem humano”. Quem seria, na verdade, este ente, que o autor chama, à primeira vista tautologicamente, de homem humano?

Do estudo que fiz de Grande Sertão: Veredas em O Roteiro de Deus (Editora Mandarim, 1996), pareceu-me que Guimarães Rosa referia-se, com essa expressão, à definição tomista das ações verdadeiramente humanas: aquelas que o homem não compartilha com os animais — compartilha, por exemplo, comer, reproduzir-se, dormir — e que decorrem da vontade, isto é, do desejo regido pelo conhecimento de seu fim, orientado pela inteligência. O homem humano seria, neste caso, o detentor do livre-arbítrio: o ente que conhece os contrários, as diversas alternativas de ação e que pode escolher entre elas; o ente que lembra suas ações passadas e seus resultados e que conhece, que antecipa, os resultados possíveis de suas ações presentes e futuras. O homem humano é aquele que tem consciência do tempo: aquele que na sua liberdade de escolha, introduzida pela razão, tem a capacidade de observar o curso dos acontecimentos e de mudá-lo, para bem ou para mal, transformando o tempo em história. É a irrupção, no seio da natureza, rompendo o seu ciclo e sua harmonia, da inteligência que tudo observa e que tudo transforma. É aquele que excede.

O homem humano deixado, assim, como um ponto final, na última frase de Grande Sertão: Veredas, é o que Guimarães Rosa vai estudar minuciosamente, na continuação de sua obra, em Primeiras Estórias, de que é o ponto inicial.

Nesse seu estudo, o autor apóia-se fortemente na tradição da cultura ocidental, que lhe veio por intermédio de suas três grandes veias principais: a grega, a judaica e a latina. Arnaldo Momigliano, em seu ensaio “The Fault of the Greeks” (Essays in ancient and modern historiography, Basil Blackwell, Oxford, 1977: 11 e 17) , estuda a fusão dessas três correntes no que se chamou helenismo:

“Existe uma antiga cultura triangular — composta de produções intelectuais judaicas, gregas e latinas — que tem um impacto imediato na maior parte de nós e que é de natureza totalmente diferente do prazer profissional ou diletante que sentimos com as amenidades de civilizações distantes. Este collegium trilingue, em termos acadêmicos, ainda domina nossas mentes (...). Na medida em que nos vem da antiguidade, nossa herança é essencialmente greco-latina-judaica porque é essencialmente helenista. A noção de civilização helenista define tanto o tempo (323-30 a.C.) quanto o espaço (zona mediterrânea) em que estas três culturas convergiram e começaram a reagir umas sobre as outras (...). Mas a fusão das tradições grega, latina e judaica é cristã.”

Segundo Momigliano, a tradição cultural ocidental é helenista e cristã. Elementos gregos, judaicos e latinos são combinados, portanto, historicamente, de maneira específica, no que se conhece por helenismo (Momigliano, 1977: 9-23), que, por sua vez, é cristianizado nos primeiros séculos de nossa era, formando, assim, a base da cultura ocidental. Elementos culturais diversos, em fusão historicamente dada, são orientados para um caminho religioso determinado — são teologizados.

Tendo em vista que a obra de Guimarães Rosa tem raízes profundas na tradição cultural ocidental não só por sua utilização de seus temas típicos, mas também pela concepção que demonstra do mundo e do homem — do homem humano —, pareceu-me possível tentar localizar, nos textos rosianos, esta fusão de que fala Momigliano — este helenismo cristianizado e, até mesmo, este helenismo em via de cristianização.

Nessa tentativa e para não nos perder na diversidade de elementos combinados no helenismo — mitológicos, filosóficos, éticos, religiosos e artísticos — será necessário isolar um tema específico da obra rosiana, que articule número significativo destes elementos diversos, e observar, a seguir, como se processa sua cristianização.

O tema que se apresenta imediatamente. por preencher os requisitos acima indicados, é o tema de Narciso, que encontramos no conto “O espelho”. De origem grega, é transposto para a literatura por escritores latinos. Esta fusão específica — o Narciso tal como encontrado em Ovídio, por exemplo — é cristianizada na obra rosiana num processo que atinge os elementos judaicos, incorporados pelo cristianismo. É esta transformação de um tema mitológico e artístico em tema eminentemente religioso que tentarei seguir, examinando os contos de Primeiras Estórias.

Brasília, dezembro de 1996.


Heloisa Vilhena de Araujo
em O Espelho
contribuição ao estudo de Guimarães Rosa
Mandarim. São Paulo. 1998.

RAPOSOS


PANEM NOSTRUM


ANTÍFONA

Ó Formas alvas, brancas, Formas claras
De luares, de neves, de neblinas!...
Ó Formas vagas. fluidas, cristalinas...
Incensos dos turíbulos das aras...

Formas do Amor, constelarmente puras,
De Virgens e de Santas vaporosas...
Brilhos errantes, mádidas frescuras
E dolências de lírios e de rosas...

Indefiníveis músicas supremas,
Harmonias da Cor e do Perfume...
Horas do Ocaso, trêmulas, extremas,
Requiem do Sol que a Dor da Luz resume...

Visões, salmos e cânticos serenos,
Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...
Dormências de volúpicos venenos
Sutis e suaves, mórbidos, radiantes...

Infinitos espíritos dispersos,
Inefáveis, edênicos, aéreos,
Fecundai o Mistério destes versos
Com a chama ideal de todos os mistérios.

Do Sonho as mais azuis diafaneidades
Que fuljam, que na Estrofe se levantem
E as emoções, todas as castidades
da alma do Verso, pelos versos cantem.

Que o pólen de ouro dos mais finos astros
Fecunde e inflame a rima clara e ardente...
Que brilhe a correção dos alabastros
Sonoramente, luminosamente.

Forças originais, essência, graça
De carnes de mulher, delicadezas...
Todo esse eflúvio que por ondas passa
Do Éter nas róseas e áureas correntezas...

Cristais diluídos de clarões alacres,
Desejos, vibrações, ânsias, alentos,
Fulvas vitórias, triunfamentos acres,
Os mais estranhos estremecimentos...

Flores negras do tédio e flores vagas
De amores vãos, tantálicos, doentios...
Fundas vermelhidões de velhas chagas
Em sangue, abertas, escorrendo em rios...

Tudo! vivo e nervoso e quente e forte,
Nos turbilhões quiméricos do Sonho,
Passe, cantando, ante o perfil medonho
E o tropel cabalístico da Morte...


Cruz e Sousaa
em Broquéis

NIKON


A BÍBLIA SAGRADA



Isaac chamou Jacó, abençoou-o e lhe deu esta ordem: “Não tomes uma mulher entre as filhas de Canaã. Levanta-te, vai a Padã-Aram, à casa de Batuel, o pai de tu mãe, e escolhe uma mulher de lá, entre as filhas de Labão, o irmão de tua mãe. Que El Shadai te abençoe, que ele te faça frutificar  e multiplicar, a fim de que te tornes uma assembléia de povos. Que ele te conceda, bem como à tua descendência, a bênção de Abraão, a fim de que possuas a terra em que vives e que Deus deu a Abraão.” Isaac despediu Jacó e este partiu para Padã-Aram, para a casa de Labão, filho de Batuel, o arameu, e irmão de Rebeca, a mãe de Jacó e Esaú.

Esaú viu que Isaac tinha abençoado Jacó e o tinha enviado a Padã-Aram para lá tomar mulher, e abençoando-o lhe dera esta ordem: “Não tomes uma mulher entre as filhas de Canaã. E Jacó obedecera a seu pai e sua mãe e partira para Padã-Aram. Esaú soube que as filhas de Canaã eram malvistas por seu pai Isaac; foi à casa de Ismael e tomou uma mulher ― além das que possuía ― Maelet, filha de Ismael, filho de Abraão, e irmã de Nabaiot.

Jacó deixou Bersabéia e partiu para Harã. Coincidiu de ele chegar a certo lugar e nele passar a noite, pois o sol havia-se posto. Tomou uma das pedras do lugar , colocou-a sob a cabeça e dormiu nesse lugar. Teve um sonho: Eis que uma escada se erguia sobre a terra e o seu topo atingia o céu, e anjos de Deus subiam e desciam por ela! Eis que Iahweh estava de pé diante dele e lhe disse: “Eu sou Iahweh, o Deus de Abraão, teu pai, e o Deus de Isaac. A terra sobre a qual dormiste, eu dou a ti e à tua descendência. Tua descendência se tornará numerosa como a poeira do solo; estender-te-ás para o ocidente e o oriente, para o norte e para o sul, e todos os clãs da terra serão abençoados por ti e por tua descendência. Eu estou contigo e te guardarei em todo lugar aonde fores, e te reconduzirei a esta terra, porque não te abandonarei enquanto não tiver realizado o que te prometi. Jacó acordou de seu sonho e disse: “Este lugar é terrível! Não ée nada menos que uma casa de Deus e a porta do céu!” Levantando-se de madrugada, tomou a pedra que lhe servira de travesseiro, ergueu-a como uma estela e derramou óleo sobre o seu corpo. A este lugar deu o nome de Betel, mas anteriormente a cidade se chamava Luza.

Jacó fez este voto: “Se Deus estiver comigo e me guardar no caminho por onde eu for, se me der pão para comer, e roupas para me vestir, se eu voltar são e salvo para a casa de meu pai, então Iahweh será meu Deus e esta pedra que ergui como uma estela será uma casa de Deus, e de tudo o que me deres eu te pagarei fielmente o dízimo.


Gn 28, 1-22.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

SÃO JOÃO DEL REI


O QUE JESUS ENSINOU E OS CRISTÃOS REPUDIAM


O QUE JESUS ENSINOU E OS CRISTÃOS REPUDIAM
Vendo ele as multidões, subiu à montanha. Ao sentar-se, aproximaram-se dele os seus discípulos. E pôs-se a falar e os ensinava, dizendo:

“Felizes os pobres no espírito,
porque deles é o Reino dos Céus.
Felizes os mansos
porque herdarão a terra.
Felizes os aflitos,
porque serão consolados.
Felizes os que têm fome
e sede de justiça,
porque serão saciados.
Felizes os misericordiosos,
porque alcançarão misericórdia.
Felizes os puros no coração,
porque verão a Deus.
Felizes os que promovem a paz,
porque serão chamados filhos de Deus.
Felizes os que são perseguidos
por causa da justiça,
porque deles é o Reino dos Céus.

Felizes sois, quando vos injuriarem e vos perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por causa de mim. Alegrai-vos e regozijai-vos, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois foi assim que perseguiram os profetas, que vieram antes de vós.


Mt 5, 1-12

NIKON


A BÍBLIA SAGRADA



Houve uma fome na terra — além da primeira fome que teve lugar no tempo de Abraão — e Isaac foi a Gerara, junto a Abimelec, rei dos filisteus. Iahweh lhe apareceu e disse: “Não desças ao Egito; fica na terra que eu te disser. Habita nesta terra, eu estarei contigo e te abençoarei. Porque é a ti e à tua raça que eu darei todas estas terras e manterei o juramento que fiz a teu pai Abraão. Eu farei a tua posteridade numerosa como as estrelas do céu, eu lhe darei todas estas terras, e por tua posteridade serão abençoadas todas as nações da terra, porque Abraão me obedeceu, guardou meus preceitos, meus mandamentos, minhas regras e minhas leis.” Isaac, pois, ficou em Gerara.

Os homens do lugar interrogaram-no sobre sua mulher e ele respondeu: “É minha irmã.” Ele teve medo de dizer: “Minha mulher,” pensando: “Os homens do lugar me matarão por causa de Rebeca, pois ela é bonita”. Ele estava lá há muito tempo quando Abimelec, rei dos filisteus, olhando uma vez pela janela, viu que Isaac acariciava Rebeca, sua mulher. Abimelec chamou Isaac e disse: “É evidente que é tua mulher! Como pudeste dizer: “É minha irmã?” Isaac lhe respondeu: “Pensei comigo: corro o risco de morrer por causa dela.” Retomou Abimelec: “Que nos fizeste? Por pouco alguém do povo dormia com tua mulher e tu nos atrairias uma falta!” Então Abimelec deu esta ordem a todo o povo: “Quem tocar neste homem e na sua mulher, morrerá.”

Isaac semeou naquela terra e, naquele ano, colheu o cêntuplo. Iahweh o abençoou e o homem se enriqueceu, enriqueceu-se cada vez mais, até tornar-se extremamente rico. Ele tinha rebanhos de bois e ovelhas e numerosos servos. Por causa disso os filisteus ficaram invejosos.


Gn 26,1-14

ENTRE RIOS DE MINAS


OS NOVOS INCONFIDENTES



Os perseguidos políticos da ditadura resultante do golpe empresarial-católico-militar de 1º de abril de 1964.

Publicação em homenagem à memória do Doutor Mílton Soares Campos.

SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS

José Inácio Romeiro Júnior
José João Abdalla
José Jofily
José Kalil
José Lamaison Porto
José Lamartine Távora
José Lélis da Costa
José Luiz de Araújo Goyano
José Manuel Reis Ferreira
José Marcondes Pereira
José Maria Alves Ribeiro
José Maria Cavalcanti
José Maria Crispim
José Maria Galvão
José Maria Rabelo
José Mariano de Freitas Beck
José Marques da Silva
José Martins Rodrigues
José Molina Júnior
José Montes Paixão
José Niepce da Silva Filho
José Palhano de Sabóia
José Pedroso Teixeira da Silva
José Pereira dos Santos
José Pires Cerveira
José Pontes Netto
José Porfírio de Souza
José Raimundo da Silva
José Rodrigues Vieira Neto
José Saldanha da Gama Coelho Pinto
José Sette de Barros
José Targino Maranhão
José Teitelrott
José Tinoco Barreto
José Udalerico dos Santos
José Valdenor Queiroz
José Viana da Silva
Josezito Moura do Amaral Padilha
Josué Apolônio de Castro
Josué Gomes
Júlia Vaena Steinbruch
Júlio Ferreira da Silva
Júlio Marques da Silva
Júlio Sambaqui
Jurandir Bezerra Lins
Jurandyr da Paixão Campos Freire
Juscelino Kubitschek de Oliveira
Justiniano da Silva Neves Neto
Justino Costa Quintana
Juvenal Campos
Kardec Leme
Kléber Kleper Ferro Leite
Kurt Wálter Graebin
Laércio Wílson Barbalho
Lauro Almeida Bandeira de Mello

OUTROS TEMPOS


GR



Então — e ele e Vargas? E ante Aranha? A dúvida pertine e o ponto pertence, cortando aqui desconversa, porquanto dentre bando e numeroso escol — os brasileiros grandes do Rio Grande — plano adiante inscritos na mesma moldura: tríade que em conjunto giro insólito a história nos trouxe. Impende a pergunta. Resposta, Deus sabe, só sou contador. Vínhamos, por exemplo, de visitar Oswaldo Aranha — feérico de talento, brilho, genialidade, uai, e daquele total conseguido esculpir-se em ser — e Neves pauteou: “Você estava extasiado, empolgado...” Mas vi e já advertira  em que não menos cedia ele à cordial fascinação. — “Sagarana (sic sempre), cuida disto para o João...” — telefonava-me Aranha alguma vez. Prezavam-se e queriam-se, alta, gauchamente; a despeito de quais-que despiques, queixas, rixas, unia-os a verdade da amizade. Getúlio Vargas, muito falávamos a seu respeito, compondo uma nossa tese de controvérsia. Meu interesse, sincero, pela imensa e imedida individualidade de Vargas, motivava-se também no querer achar, em sã hipótese, se era por dom congênito, ou de maneira adquirida mediante estudo e adestramento, que ele praticava o wu wei — “não interferência”, a norma da fecunda inação e repassado não-esforço de intuição — passivo agente a servir-se das excessivas forças em torno e delas recebendo tudo pois “por acréscimo”. — “Enigma nenhum, apenas um fatalista de sorte...” — encurtava João Neves, experimentando fácil dissuadir-me. Mas, apto ele mesmo ao mistério, sensível às cósmicas correntes, à anima mundi antiga, teria de hesitar, de vez em quase, também a memória cobradora beliscando-o. — “De fato o Getúlio dá estranhezas, nunca ofegou ou tiritou, nem se lastimava de frio ou calor, que nós outros todos padecíamos, nada parecia mortificá-lo...” — concedia-me, assim, pequenas observações. Logo, porém, sacudia-se daquilo. Fazia pouco de minha admiração-e-simpatia por Vargas, sem com ela se agastar. Diferença fundamental de temperamentos em contraste — o ousado opugnador sem coleios e o elaborador expectante do contempo — de certo modo inconciliava-os: por um lado insofrido espanejar-se contra visco, de outra banda quieto apartar-se de picadas. Voltas e contravoltas de longo acontecer, as vãs vicissitudes fizeram o resto. Ou injunções de foro íntimo, públicas concepções diversas. Aproximações, afastamentos, reaproximações, como termos periódicos, patenteiam nada de outro que uma forma do “kaempfende Liebe”, de afeto combatente. Demais, não se pisaram nem cuspiram nos ponchos, haveriam de entender-se, dia ou dia, em fim; já não pelo hábito caroável e em tradição cavalheiresca, mas por vinculação predeterminada e obedecida, acima de dessemelhanças ou revergências no obscuro e ambíguo das causas transitórias. Lembremo-nos sempre do que ainda não houve.  Retirou-lhes a tragédia a extensão dessa substância amorfa e escolhedora — o tempo. Esta horária vida não nos deixa encerrar parágrafos, quanto mais terminar capítulos. Entanto que, como viável esteira do próprio tempo, só nos resta, a nós, cegos rastreadores, o desconjuntado flou de uma má montagem. Recordo: “As coisas estão amarradinhas é em Deus!” — entimema único que punha em acordo minhas Vovó Chiquinha, de Traíras, no Rio das Velhas, e Vovó Graciana, de um povoado do Paredão do Urucuia.

Mesmo em meio de política.


João Guimarães Rosa
Discurso de Posse   

terça-feira, 24 de abril de 2012

RAPOSOS


PANEM NOSTRUM



Os seus enfeites,
Suas bandeiras,
O amplo velame
Dormem na sombra.

Os mastaréus
Furam a treva:
Na tarde fria
São como ogivas.

É um mudo rito,
Agudo, agudo
No ar nevoento.

E a nave suave
Parece uma ave
Insubsistente.


Jorge de Lima
Livro de Sonetos

ENTRE RIOS DE MINAS


OS NOVOS INCONFIDENTES



Os perseguidos pela ditadura resultante do golpe empresarial-católico-militar de 1º de abril de 1964.

Publicação em homenagem à memória do Doutor Milton Soares Campos.

SUSPENSÃO DE DIREITOS POLÍTICOS

Jorge Alberto Campezato
Jorge Antônio Andere
Jorge Carone Filho
Jorge Cheuen
Jorge Cury
Jorge do Nascimento
Jorge Miguel Nassar
Jorge Pinto de Souza
Jorge Rucas
José Aguiar Dias
José Akel Fares
José Alberto da Silva
José Alberto Davies de Freiras
José Alencar Furtado
José Alves Moreira
José Anselmo dos Santos
José Antônio Rogê Ferreira
José Aparecido de Oliveira
José Arlindo dos Santos
José Arnaldo Gomes Neto
José Augusto de Araújo
José Augusto Pereira das Neves
José Baltazarino dos Santos
José Barbalho Bezerra
José Barbosa Porto
José Batista Júnior
José Bernardo Cabral
José Blanchard Girão Ribeiro
José Campelo Filho
José Carlos Estelita Guerra
José Cortes Pereira de Araújo
José da Rocha Mendes Filho
José da Silva
José de Albuquerque Sales
José de Amorim Pereira
José de Castro Ferreira
José de Moura Beleza
José dos Santos Mendonça
José Edmar de Oliveira Morel
José Fagundes de Menezes
José Feliciano de Figueiredo
José Fernandes Pedral Sampaio
José Ferreira de Amorim
José Ferze Tau
José Firmo de Aguiar
José Fiúza Gomes
José Francisco de Oliveira
José Francisco Ferreira
José Gílton Pinto Garcia
José Gomes
José Gomes da Silva
José Gomes Pimenta
José Gomes Talarico
José Guimarães Neiva Moreira
José Haroldo Magalhães Martins
José Ignácio Ferreira
José Inácio da Silva

segunda-feira, 23 de abril de 2012

OH MINAS GERAIS!


ROMANCE XXIV OU DA BANDEIRA DA INCONFIDÊNCIA



Através de grossas portas,
sentem-se luzes acesas,
− e há indagações minuciosas
dentro das casas fronteiras:
olhos colados aos vidros,
mulheres e homens à espreita,
caras disformes de insônia,
vigiando as ações alheias.
Pelas gretas das janelas,
pelas frestas das esteiras,
agudas setas atiram
a inveja e a maledicência.
Palavras conjeturadas
oscilam no ar de surpresas,
como peludas aranhas
na gosma das teias densas,
rápidas e envenenadas,
engenhosas, sorrateiras.

Atrás de portas fechadas,
à luz de velas acesas,
brilham fardas e casacas,
junto com batinas pretas.
E há finas mãos pensativas,
entre galões, sedas, rendas,
e há grossas mãos vigorosas,
de unhas fortes, duras veias,
e há mãos de púlpito e altares,
de Evangelhos, cruzes, bênçãos.
Uns são reinóis, uns, mazombos;

e pensam de mil maneiras;
mas citam Virgílio e Horácio,
e refletem, e argumentam,
falam de minas e impostos,
de lavras e de fazendas,
de ministros e rainhas
e das colônias inglesas.

Atrás de portas fechadas,
À luz de velas acesas,
Uns sugerem, uns recusam,
Uns ouvem, uns aconselham.
Se a derrama for lançada,
Há levante, com certeza.
Corre-se por essas ruas?
Corta-se alguma cabeça?
Do cimo de alguma escada,
Profere-se alguma arenga?
Que bandeira se desdobra?
Com que figura ou legenda?
Coisas da Maçonaria,
do Paganismo ou da Igreja?
A Santíssima Trindade?
Um gênio a quebrar algemas?

Atrás de portas fechadas,
à luz de velas acesas,
entre sigilo e espionagem,
acontece a Inconfidência.
E diz o Vigário ao Poeta:
“Escreva-me aquela letra
do versinho de Virgílio...”
E dá-lhe o papel e a pena.
E diz o Poeta ao Vigário,
com dramática prudência:
“Tenha meus dedos cortados,
antes que tal verso escrevam...”
LIBERDADE, AINDA QUE TARDE,
Ouve-se em redor da mesa.
E a bandeira já está viva
e sobe na noite imensa.
E os seus tristes inventores
já são réus ― pois se atreveram
a falar em Liberdade
(que ninguém sabe o que seja).

Através de grossas portas,
sentem-se luzes acesas,
― e há indagações minuciosas
dentro das casas fronteiras.
“Que estão fazendo, tão tarde?
Que escrevem, conversam, pensam?
Mostram livros proibidos?
Lêem notícias nas Gazetas?
Terão recebido cartas
de potências estrangeiras?
(Antiguidades de Nîmes
em Vila Rica suspensas!
Cavalo de La Fayette
saltando vastas fronteiras!
Ó vitórias, festas, flores
das lutas da Independência!
Liberdade ― essa palavra
que o sonho humano alimenta:
que não há ninguém que explique,
e ninguém que não entenda!)”
E a vizinhança não dorme:
murmura, imagina, inventa.
Não fica bandeira escrita,
mas fica escrita a sentença.


Cecília Meireles
em Romanceiro da Inconfidência.