Como se dizia das eleições da Primeira República: quanto
mais perfeitas as atas, mais falsas as eleições. Ou no latinório caro aos
juristas, summum jus, summa injuria
(o máximo de direito é o máximo de injustiça). Em meus tempos de estudante
dizíamos brasileiramente dura lex, sed
lastex (a lei é dura, mas espicha). Dessa situação, aproveitam-se todos os
que têm recursos para contratar os melhores advogados do país, que, por sua
vez, sabem muito bem como esgrimir a miríade de recursos a seu dispor e com
eles convencer juízes.
É assim que, passados alguns anos do crime do mensalão,
realizadas mais de 60 sessões de julgamento pela suprema corte do país, ainda
se achou como argumentar que o direito de defesa dos réus de luxo ainda não se
tinha esgotado. Foram mobilizados os embargos infringentes, criados por
dispositivo regimental não confirmado em lei. É pena que tanta garantia seja
reservada a poucos privilegiados e negada a dezenas de milhões de brasileiros.
Esse uso do direito ao devido processo legal é a negação da igualdade perante a
lei, base da República.
José Murilo de Carvalho
em O Globo, de segunda-feira 30.9.2013