quarta-feira, 20 de março de 2013

HISTÓRIA DA INTELIGÊNCIA BRASILEIRA



O regime instituído pela Constituição de 1934 foi desde logo encarado como simples interregno entre a Revolução de 1930 e as estruturas políticas que ela devia estabelecer — e que, no caso, foram as de 1937. A legislação trabalhista, inclusive a idéia de uma justiça específica, começa, como se sabe, desde a criação do Ministério do Trabalho; e a outra constante do regime de 1937, a forte unidade nacional contra os excessos do federalismo republicano, era uma aspiração expressa de 1930, como se lê no artigo de Américo Palha, “De pé pelo  Brasil”:

A Revolução desfraldou, no seu advento, a bandeira da unidade nacional (...). A Revolução até agora não conseguiu realizar o postulado da unidade —regionalismo.

Dir-se-ia, pois, à primeira vista, que um regime político de Direita era o resultado, não só inevitável, mas normal, da revolução esquerdista de  1930, mas a verdade é que, para além das fáceis polarizações polêmicas e jornalísticas, Direita e Esquerda sempre intercambiaram os respectivos princípios e conseqüências, a tal ponto que é pura convenção designarmos os regimes políticos autoritários por uma ou outra dessas etiquetas. São “de Direita”, para os esquerdistas, todos os governos dominados por seus adversários —  e vice-versa. A prova está em que, no caso brasileiro, o regime de 1937 foi visto como “fascista” e, a esse título, direitista, pelos contemporâneos e, nomeadamente, pelos esquerdistas — o que nos preparava mal para aceitar e compreender o processo de esquerdização historiográfica de que foram objeto, já em nossos dias, Getúlio Vargas e o Estado Novo, para nada dizer de Artur Bernardes e seu nacionalismo econômico.

É certo que, em 1933, a Esquerda se havia notavelmente “direitizado”, na mesma medida em que a Direita revelava inquietantes tendências esquerdistas; tratando do problema na terceira edição, então publicada,  do seu livro O Socialismo no Brasil, Antônio Piccarolo referia-se ao programa  do Centro Socialista Paulistano, que dizia “apoiar todas as iniciativas que tendem a aumentar a liberdade e a independência dos colonos”, favorecendo a pequena propriedade, o patronato de assistência, os escritórios de colocação, o patrocínio jurídico gratuito, as cooperativas de consumo, as escolas primárias e agrícolas, etc., etc.; “tudo isso não é rigorosamente socialismo”, concluía o desalentado Piccarolo, “mas é tudo o que de bom e prático podem fazer aqui os socialistas”.


Wilson Martins
História da Inteligência Brasileira
vol. VII (1933-1960)
Cultrix. Editora da Universidade de São Paulo.
São Paulo, SP. 1979.