O regime instituído pela Constituição de 1934 foi
desde logo encarado como simples interregno entre a Revolução de 1930 e as
estruturas políticas que ela devia
estabelecer — e que, no caso, foram as de 1937. A legislação
trabalhista, inclusive a idéia de uma justiça específica, começa, como se sabe,
desde a criação do Ministério do Trabalho; e a outra constante do regime de 1937, a forte unidade
nacional contra os excessos do federalismo republicano, era uma aspiração expressa
de 1930, como se lê no artigo de Américo Palha, “De pé pelo Brasil”:
A Revolução
desfraldou, no seu advento, a bandeira da unidade nacional (...). A Revolução
até agora não conseguiu realizar o postulado da unidade —regionalismo.
Dir-se-ia, pois, à primeira vista, que um regime
político de Direita era o resultado, não só inevitável, mas normal, da
revolução esquerdista de 1930, mas a
verdade é que, para além das fáceis polarizações polêmicas e jornalísticas,
Direita e Esquerda sempre intercambiaram os respectivos princípios e
conseqüências, a tal ponto que é pura convenção designarmos os regimes
políticos autoritários por uma ou outra dessas etiquetas. São “de Direita”,
para os esquerdistas, todos os governos dominados por seus adversários — e vice-versa. A prova está em que, no caso
brasileiro, o regime de 1937 foi visto como “fascista” e, a esse título,
direitista, pelos contemporâneos e, nomeadamente, pelos esquerdistas — o que
nos preparava mal para aceitar e compreender o processo de esquerdização
historiográfica de que foram objeto, já em nossos dias, Getúlio Vargas e o
Estado Novo, para nada dizer de Artur Bernardes e seu nacionalismo econômico.
É certo que, em 1933, a Esquerda se havia
notavelmente “direitizado”, na mesma medida em que a Direita revelava
inquietantes tendências esquerdistas; tratando do problema na terceira edição,
então publicada, do seu livro O Socialismo no Brasil, Antônio
Piccarolo referia-se ao programa do
Centro Socialista Paulistano, que dizia “apoiar todas as iniciativas que tendem
a aumentar a liberdade e a independência dos colonos”, favorecendo a pequena
propriedade, o patronato de assistência, os escritórios de colocação, o
patrocínio jurídico gratuito, as cooperativas de consumo, as escolas primárias
e agrícolas, etc., etc.; “tudo isso não é rigorosamente socialismo”, concluía o
desalentado Piccarolo, “mas é tudo o que de bom e prático podem fazer aqui os
socialistas”.
Wilson Martins
História da Inteligência Brasileira
vol. VII (1933-1960)
Cultrix. Editora da Universidade de São Paulo.
São Paulo, SP. 1979.