Outra circunstância ou condição favoreceu o português,
tanto quanto a miscibilidade e mobilidade, na conquista de terras e no domínio
de povos tropicais: a aclimatabilidade.
Nas condições físicas de solo e de temperatura,
Portugal é antes África do que Europa. O chamado “clima português” de Martone,
único na Europa, é um clima aproximado do africano. Estava assim o português
predisposto pela sua mesma mesologia ao contato vitorioso com os trópicos: seu
deslocamento para as regiões quentes da Europa não traria as graves
perturbações da adaptação nem as profundas dificuldades de aclimatação
experimentadas pelos colonizadores vindos de países de clima frio.
Por mais que Gregory insista em negar ao clima
tropical a tendência para produzir per se
sobre o europeu do Norte efeitos de degeneração, recordando ter Elkington
verificado em 1922 na colônia holandesa de Kissav, fundada em 1783, condições
satisfatórias de salubridade e prosperidade, sem nenhuma evidência de
degeneração física (“obvious evidence of
physical degeneration”) entre os colonos louros, grande é a massa de
evidências que parecem favorecer o ponto de vista contrário: o daqueles que
pensam revelar o nórdico fraca ou nenhuma aclimatabilidade nos trópicos. O
professor Oliveira Viana, desprezando com extrema parcialidade depoimentos como
os de Elkington e Gregory, aos quais nem sequer alude, reuniu contra a
pretendida capacidade de adaptação dos nórdicos aos climas tropicais o
testemunho de alguns dos melhores especialistas modernos em assunto de
climatologia e antropogeografia: Taylor, Glenn Trewarka, Huntington, Karl
Sapper. Deste cita o sociólogo brasileiro expressivo juízo sobre os esforços
colonizadores dos europeus do Norte nos trópicos:
Os europeus
do Norte não têm conseguido constituir, nos planaltos tropicais, senão
estabelecimentos temporários. Eles têm tentado organizar, nestas regiões, uma
sociedade permanente, de base agrícola, em que o colono viva do seu próprio
trabalho manual; mas em todas essas tentativas têm fracassado.
Mas é Taylor, talvez, aquele dentre os antropólogos
cujas conclusões se contrapõem com mais força e atualidade às de Gregory. Antes
dos estudos de Taylor e de Huntington, de Antropogeografia e Antropologia
Cultural e dos de Dexter, de Climatologia, já Benjamin Kidd observara quanto à
aclimatação dos europeus do Norte nos trópicos: “todas as experiências nesse
sentido têm sido vãos e inúteis esforços desde logo destinados a fracasso (“foredoomed to failure”). E Mayo Smith
concluíra do ponto de vista da estatística aplicada à Sociologia: “As nossas
estatísticas não são suficientemente exatas para indicarem ser impossível
aclimatar-se permanentemente o europeu nos trópicos, mas mostram ser isto
extremamente difícil.”
Gilberto Freyre
Casa-Grande & Senzala