Ele
propunha a criação do imposto de renda, cujos recursos seriam inteiramente
aplicados à educação; somado ao das bebidas alcoólicas, que também sugeria, os
dois impostos produziriam 200 mil contos anualmente. A Gazeta, de São Paulo, acusou-o de estar promovendo, com a
extinção do analfabetismo, a destruição da agricultura nacional, porque “só o
analfabeto é que trabalha no campo; dessa forma, respondia Miguel Couto, o
Brasil estava sofrendo de uma nova carência: a carência de analfabetos.
Chegava, pois, oportunamente a segunda edição do Espírito do Nosso Tempo, no qual Gilberto Amado denunciava a onda
reacionária que parecia então predominar:
A Escolástica procura substituir a
Enciclopédia no domínio dos espíritos. Voltaire e Rousseau são abatidos,
enquanto Santo Tomás de Aquino é exaltado (...) Enfim, o que define, o que
caracteriza espírito do nosso tempo é,
na ordem mental propriamente dita — a reação contra a ciência e suas aplicações,
contra o método experimental, contra o método histórico, contra o século XIX
enfim; e na ordem social (...) a reação contra a Revolução Francesa, contra o
liberalismo político e econômico, suas conseqüências e desenvolvimentos.
O
Brasil devia seguir o modelo proposto pela democracia norte-americana:
Em tudo ela nos dá a lição que nos
convém, mesmo nas suas limitações. Nela e nas suas projeções ocidentais, nessa
hipertrofia prática da Europa, a América do Norte, é que estão os exemplos e
modelos a seguir. A Europa nos dá a lição da intensidade. A América do Norte,
pelo poder criador, é uma Europa de vinte anos. Infiltremos no nosso sangue o
mesmo espírito de criação(...). Não é bom brasileiro aquele que se contenta,
que se satisfaz com o que existe no campo econômico quando a nossa riqueza é
uma esperança ainda escondida no fundo da terra, e com o que existe no campo
político-social, quando a organização do país está ainda por fazer. Se os
americanos do Norte tivessem esse mesmo sentir o peito lhes inchasse ao
constituir ao constituir a sua República, numa fartura pletórica , numa
satisfação inundante, não seriam hoje o que são.
Nem
todos concordavam com essas indicações; discursando na Assembléia Constituinte,
a 20 de dezembro, dizia, por exemplo, o deputado Agamênon Magalhães: “Pergunto
à Assembléia se os escritores citados pelo nobre colega [Levi Carneiro], todos
eles americanos, que defendem a doutrina americana contra a crítica dos
tratadistas franceses; pergunto a V. Exa., Sr. Presidente, se essa crítica
parcial, oposta à européia, não tem a eiva de suspeição?”
A
Constituinte conseguira afinal reunir-se, malgrado o atraso imposto pela
revolta paulista do ano anterior, cuja futilidade o presidente Getúlio Vargas
não deixou de acentuar, a 15 de novembro, no discurso solene de instalação:
Decretado o Código Eleitoral,
seguiram-se todos os atos indispensáveis à execução rápida do alistamento,
marcando-se até o dia para a eleição dos Constituintes. Comprova a sinceridade
das deliberações e providências tomadas o fato e se ter realizado o pleito na
data previamente estabelecida, apesar de perturbada a tranqüilidade do país,
durante três longos meses.
Mas,
já era evidente, a essa altura, que a Segunda República não queria sucumbir,
como a Primeira, aos encantos da “ilusão americana” em nenhum dos seus
aspectos. Assim, por exemplo, aparteando o deputado Guaraci Silveira, que
falava sobre a questão religiosa, exclamava a 13 de dezembro, exclamava a 13 de
dezembro o seu colega por São Paulo, Plínio Correia de Oliveira: “E se V. Exa.
apresentar emenda proibindo o cinema no Brasil, terá o meu voto”, — “cinema”
significando então, claro está, as produções de Hollywood. É outro “pequeno
fato significativo”, confirmado, em plano mais severo, pelos debates
ideológicos da época.
Wílson
Martins
História
da Inteligência Brasileira
vol.
VII (1933-1960)
Cultrix.
Editora da Universidade de São Paulo.
1ª
edição. 1979.