Todo
o episódio do julgamento é um recorte de romance de cavalaria transposto para o
sertão. A grandiloqüência das palavras realça a nobreca da ação; é de barões o
diálogo entre Joca Ramiro e Zé Bebelo:
—
“O julgamento é meu, sentença que dou vale em todo este norte. Meu povo me
honra. Sou amigo dos meus amigos políticos, mas não sou criado deles, nem
cacundeiro. A sentença vale. A decisão. O senhor reconhece?”
—
“... Agora, com sua licença, a pergunta faço: pelo quanto tempo eu tenho de
estipular, sem voltar neste Estado, nem na Bahia?
—
“Até enquanto eu vivo for, ou não der contra-ordem”.
E
o vencido, cumprindo a palavra da, vai rumo de Goiás, escoltado honrosamente
pelo cabra Friol, distância de três léguas, “por o uso de resguardado
território”; Joca Ramiro deixa o acampamento para região ignorada: “Lá ia ele
deveras, em seu cavalão branco ginete. ladeado por sô Candelário e o Ricardão —
igual iguais galopavam”.
O
sentimento de honra — o orgulho da luta sem outro galardão além da glória — inflama
os jagunços do Grande Sertão. No julgamento de Zé Bebelo, Riobaldo fala da
história que há de guardar o nome dos valentes, a fama de suas façanhas: “Nela
todo mundo vai falar pelo Norte dos Nortes, em Minas e na Bahia todas,
constantes anos, até em outras partes... Vão fazer cantigas relatando as tantas
façanhas”. E sô Candelário, que era bom e que buscava a morte nos combates para
sufocar o medo de ficar leproso, repete as mesmas idéias, quase com as mesmas
palavras: “Seja a fama de glória... Todo mundo vai falar nisso, por muitos
anos, louvando a honra da gente, por muitas partes e lugares.”
M.
Cavalcanti Proença
Trilhas
no Grande Sertão
Ministério
da Educação e Cultura.
Os
Cadernos de Cultura 114.
Rio
de Janeiro, DF. 1958.