sábado, 21 de julho de 2012

A SANÇÃO SOFRIDA PELOS PROFESSORES




[...] A sanção sofrida pelos professores e pesquisadores punidos pelo AI-5 tem uma característica profundamente injusta e diabolicamente cruel: ela é total e perpétua.

É total porque os aposentados pelo nefando Ato foram, pelo Ato Complementar nº 77 de 22 de outubro de 1969, proibidos de, a qualquer título, exercer qualquer atividade em instituições de ensino ou pesquisa oficiais ou que recebessem qualquer subvenção oficial, isto é, praticamente todos os estabelecimentos dessa natureza no Brasil.

Fecharam-se todas as portas às suas vítimas.

Esse ato complementar, que é uma obra prima de maldade, teve sua legitimidade contestada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, baseada em bem fundamentado parecer jurídico, mas foi amplamente aplicado em todas as Universidades brasileiras.

A sanção é perpétua porque não teve sua vigência limitada, ao contrário da suspensão dos direitos políticos que foi restrita a 10 anos.

Em conseqüência vemos diariamente políticos cassados voltarem à atividade partidária e mesmo concorrerem a eleições, muitos deles conquistando mandatos populares.

Atualmente no Brasil não há mais prisões perpétuas, extinguiu-se a pena de morte, aboliu-se o banimento.

Mas os professores e os pesquisadores científicos continuam impedidos de exercer suas atividades, em claro desrespeito a um dos mais sagrados direitos humanos: o direito ao trabalho.

A singularidade desta pena cria situações extremamente anômalas como a do eminente Professor Fernando Henrique Cardoso, que, tendo sido aposentado como docente da Universidade de São Paulo e tido seus direitos políticos cassados, foi eleito a 15 de novembro suplente do Senador Franco Montoro. Poderá, então, se convocado para exercer a senatoria falar a todo o povo brasileiro da mais alta tribuna, o Senado Federal, mas continuará impedido de lecionar a meia dúzia de alunos dentro de uma sala de aula.

O mesmo poderá acontecer ao nosso querido Professor Edgar de Godói da Mata-Machado, que recentemente filiado ao Movimento Democrático Brasileiro, se o quiser, conquistará sem dúvida, na primeira eleição, um mandato eletivo, mas permanecerá afastado de sua Faculdade de Direito, que tanto honrou, caso persista a situação atual.

Cabe aqui uma pergunta: serão os professores tão terrivelmente mais perigosos à segurança nacional que os políticos?

A inexplicável e extrema severidade, digamos mesmo crueldade, das sanções impostas aos intelectuais fez com que, em grande número, buscassem em países estrangeiros a oportunidade de sobrevivência que lhes era negada no Brasil e hoje ocupam cargos de grande responsabilidade em instituições de importância mundial, como o Instituto Pasteur de Paris, O Instituto Rockefeller de Nova York, a Organização Mundial de Saúde e várias universidades da Europa e da América.

Apesar disso, muitos deles, senão todos, desejam ardentemente regressar à Pátria, mas como fazê-lo se aqui lhes são negados os simples meios de subsistência e mesmo o indispensável passaporte?

Não seriam esses homens úteis ao Brasil, como o são a outros países? Ou será que a Revolução, como a sua congênere francesa, não precisa de sábios? [...]


[...] Embora tenha sido para mim motivo de viva alegria e imenso conforto, não me causou qualquer surpresa a atitude do Instituto de Ciências Biológicas , através da sua Congregação, conferindo-me o título de Professor Emérito, o mais alto que pode almejar um velho professor universitário aposentado.

Não me surpreendeu porque conheço bem meus colegas. Deles tenho recebido desde os torvos dias de setembro de 1969 as mais claras provas de solidariedade, ainda em plena vigência do regime de denúncias, delações, vinganças e perseguições, movidas pelo ódio e pela inveja, que caracterizou aquele negro período de nossa história, quando os punidos pelo sistema eram considerados tabu, mais perigosos que os leprosos na Idade Média ou os judeus durante o terror nazista e cuja simples aproximação poderia constituir grave risco. [...]     


[...] Tive a suprema ventura de participar da luta vitoriosa contra o terror nazi-fascista nos campos de batalha da Itália, junto com os meus companheiros  da Força Expedicionária Brasileira [...]


Prof. Amílcar Vianna Martins
Pela Democracia, por uma Sociedade Humana
Discurso por ocasião do recebimento do título de
Professor Emérito da UFMG
em UFMG Resistência e Protesto
Vega. Belo Horizonte. 1979.