ÚLTIMA
CANÇÃO DO BECO
Beco
que cantei num dístico
Cheio
de elipses mentais,
Beco
das minhas tristezas,
Das
minhas perplexidades
(Mas
também dos meus amores,
Dos
meus beijos, dos meus sonhos),
Adeus
para nunca mais!
Vão
demolir esta casa,
Mas
meu quarto vai ficar,
Não
como forma imperfeita
Neste
mundo de aparências:
Vai
ficar na eternidade,
Com
seus livros, com seus quadros,
Intacto,
suspenso no ar!
Beco
de sarças de fogo,
De
paixões sem amanhãs,
Quanta
luz mediterrânea
No
esplendor da adolescência
Não
recolheu nestas pedras
O
orvalho das madrugadas,
A
pureza das manhãs!
Beco
das minhas tristezas,
Não
me envergonhei de ti!
Foste
rua de mulheres?
Todas
são filhas de Deus!
Dantes
foram carmelitas...
E
eras só de pobres quando,
Pobre,
vim morar aqui.
Lapa
― Lapa do Desterro ― ,
Lapa
que tanto pecais!
(Mas
quando bate seis horas,
Na
primeira voz dos sinos,
Como
na voz que anunciava
A
conceição de Maria,
Que
graças angelicais!)
Nossa
Senhora do Carmo,
De
lá de cima do altar,
Pede
esmolas para os pobres,
―
Para mulheres tão tristes,
Para
mulheres tão negras,
Que
vêm nas portas do templo
De
noite se agasalhar.
Beco
que nasceste à sombra
De
paredes conventuais,
És
como a vida, que é santa
Pesar
de todas as quedas.
Por
isso te amei constante
E
canto para dizer-te
Adeus
para nunca mais!
25
de março de 1942.
Manuel
Bandeira
Lira
dos Cinqüent’Anos