sábado, 12 de abril de 2014

OS INCONFIDENTES


ASSENTADA
Aos vinte e sete dias do mês de junho de mil e setecentos e oitenta e nove anos, nesta Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar do Ouro Preto e casas do Desembargador Pedro José Araújo de Saldanha, Ouvidor e Corregedor desta Comarca, onde eu Escrivão fui vindo e, sendo aí, pelo dito Ministro foram perguntadas as testemunhas das quais seus nomes, naturalidades, moradas, ofícios, idades e ditos são os que ao diante se seguem, do que para constar fiz este termo, e eu Bacharel José Caetano César Manitti, Escrivão nomeado, o escrevi.

Testemunha 15ª

José Antônio de Melo, Tenente do Regimento de Cavalaria Paga  desta Capitania, natural de Torres Novas, Comarca de Santarém, idade de quarenta e oito anos, testemunha a quem o dito Ministro deferiu o juramento dos Santos Evangelhos em um livro deles, em que pôs sua mão direita, subcargo do qual lhe encarregou dissesse a verdade do que soubesse e lhe fosse perguntado, o que assim prometeu fazer como lhe era encarregado.

E perguntado pelo conteúdo no Auto desta Devassa que todo lhe foi lido, disse que somente se lembra que, indo visitá-lo, quando chegou do Destacamento do Paracatu de que foi comandante, um Alferes do seu Regimento, Joaquim José da Silva, por alcunha o Tiradentes, e mostrando-lhe uns papéis que trazia, com despachos do Conselho do Ultramar para informar o Excelentíssimo Vice-Rei do Estado, dizendo que eram sobre umas águas que ele, dito Alferes, pretendia meter na cidade do Rio de Janeiro, acrescentara que nada já queria de Minas, porque era um país desgraçado, porque tirando-se dele tanto ouro e diamantes, nada lhe ficava e tudo saía para fora, e os pobres filhos da América sempre famintos e sem nada de seu, porquanto desta sorte não pode haver estabelecimentos perduráveis. E são tão estúpidos os seus nacionais que se não lembram disto, ou pelo menos do que sucedeu de fresco na América Inglesa. Ao que ele, testemunha, respondeu que “tinha dito um milhão de despropósitos e que riscasse semelhantes ideias do pensamento”, depois do que se despediu e de nada mais sabe ele, testemunha.

E perguntado pelo referimento que nele fez o Sargento-Mor José de Vasconcelos Parada e Sousa, que lhe foi lido, disse que tudo quanto nele se declara passou assim na verdade, o que já substancialmente depôs, faltando-lhe só, por esquecimento, acrescentar uma circunstância que presentemente lhe avivou o mesmo referimento, como a de lhe ponderar o dito Alferes que, pela pobreza deste país, donde saía tudo para Portugal, não tinham os pais e irmãos com que dotar suas filhas e irmãs; e que, de três em três anos, vinham os Generais e suas famílias encher-se, e ficavam sempre os nacionais pobres. E mais não disse, nem do dito referimento, nem aos costumes a que foi perguntado. E assinou com o referido Ministro, depois de lhe ser lido o seu juramento, que achou conforme, e eu, o Bacharel José Caetano César Manitti, Escrivão nomeado, o escrevi.


Saldanha  -  José Antônio de Melo



Autos de Devassa da Inconfidência Mineira
Publicação da Câmara dos Deputados e do
Governo do  Estado de Minas Gerais – I.
Brasília / Belo Horizonte. 1976.