segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

OS INCONFIDENTES


TESTEMUNHA 10ª

Antônio de Afonseca Pestana, Sargento-Mor do Regimento de Cavalaria Auxiliar de São José, Comarca de Rio das Mortes, natural da mesma Vila e nela morador no sítio chamado de Pedra; que vive de suas fazendas, de idade de quarenta e seis anos, testemunha a quem ele, dito Ministro, deferiu o juramento dos Santos Evangelhos em um livro deles em que pôs sua mão direita, subcargo do qual lhe encarregou que jurasse a verdade do que soubesse e lhe fosse perguntado, o que assim prometeu fazer como lhe estava encarregado.

E perguntado ele, testemunha, pelo conteúdo no Auto desta Devassa, que todo lhe foi lido, disse que vindo ele em certa ocasião pela Vila de São João del-Rei, onde costumava ir muitas vezes às suas dependências, encontrara na Rua do Carmo ao Alferes Joaquim José, por alcunha o Tiradentes; e perguntando-lhe este depois de se cumprimentarem, como ia de utilidades, lhe respondeu ele, testemunha, que muito mal pelas diminutas conveniências que se faziam; ao que replicou, o dito Alferes, que este país das Minas era fertilíssimo e riquíssimo de tudo e, a não ir toda sua riqueza para fora, seria a terra da maior utilidade; e que tempo viria em que acontecesse alguma sublevação, e escusariam os moradores de sofrer derramas e outras imposições, e de aturar ministros que faziam insolências à terra. Ao que tudo ele, testemunha, lhe respondeu que não fosse louco, e que semelhantes matérias nem se falavam, nem se ouviam. E se retirou imediatamente, não pensando que o dito Alferes dissesse aquelas palavras com ânimo dobrado e com segunda tenção.

Em outra ocasião, indo àquela Comarca o Ajudante de Ordens João Carlos Xavier da Silva Ferrão, a passar revista aos Regimentos Auxiliares de ordem do Excelentíssimo Senhor Visconde General, achando-se o dito Ajudante de Ordens em casa do Capitão José de Resende Costa, no Distrito da Laje, passando-se revista ao Regimento de que é Coronel Severino Ribeiro, e estando aí presente ele, testemunha, observou que o Coronel Joaquim Silvério dos Reis, que também se achava assistindo, dissera perante os circunstantes (de cujos nomes só lhe lembra unicamente o Sargento-Mor Luís Vaz de Toledo Piza), que esta terra era muito abundante de ouro e pedras preciosas e que, da mesma sorte, produzia muitos efeitos utilíssimos; e que viria tempo em que se tornasse um florente Império.

E quando ele, testemunha, vinha agora para esta vila, encontrou no caminho um homem chamado José Francisco Dutra, morador para as partes da Igreja Nova, Comarca do Rio das Mortes, o qual conversando a respeito das prisões do Alferes Joaquim Tiradentes, e outros, lhe contara que tinha ouvido dizer que, já no tempo do governo do Excelentíssimo Senhor Luís da Cunha e Meneses, o mesmo Alferes andara com mania de falar em levantes nestas Minas. E declara mais ele, testemunha, que depois das ditas prisões, assim no Rio de Janeiro como nesta Vila Rica e na Comarca do Rio das Mortes, do dito Tiradentes, Joaquim Silvério, o coronel Alvarenga, o padre Carlos, vigário da Freguesia de São José, o Desembargador Gonzaga, e Domingos de Abreu, ouvira publicamente discorrer que as sobreditas prisões derivavam: uns, de diamantes; outros, de extravio de ouro em pó. Mas que passados alguns dias mais, era voz constante que aqueles procedimentos nasciam de notícias de alguma sublevação; e que por ele, testemunha, ser sabedor destes discursos, viera ultimamente denunciar os já referidos fatos ao Excelentíssimo Senhor Visconde General, como efetivamente executou; e mais não disse, nem dos costumes, a que foi perguntado, e só declara ser compadre do coronel Inácio José de Alvarenga; e assinou com o dito Ministro, lido o juramento, e eu, o bacharel José Caetano César Manitti, escrivão nomeado, o escrevi.



Saldanha  — Antônio de Afonseca Pestana