sábado, 22 de fevereiro de 2014

MINAS GERAIS


MUNICÍPIO DE OURO PRETO


DISCRIPÇÃO E NOTÍCIA HISTÓRICA DA CIDADE DE OURO-PRETO, CAPITAL DA PROVÍNCIA DE MINAS

Os primeiros habitantes das margens dos ribeirões, que vertem das impinadas serras que cercam esta cidade, forão Antonio Dias Taubateno, o padre João de Faria Fialho, que legarão seus nomes a dous bairros da cidade, e os paulistas Thomas Lopes de Camargos e Francisco Bueno da Silva, os quaes vierão aqui ter em 1699.

A riqueza encontrada no solo de Vila-Rica foi attrahindo aventureiros e ambiciosos de ouro, e em pouco tempo a população cresceu e dispersou-se pelos arrebaldes de S. Sebastião, Santa Anna, S. João, Pão-Doce, Ramos, Antonio Dias e Ouro-Preto.

Desde aquella época de 1699 até 1709 tantas e tão repetidas forão as rixas, que a anarchia veio aqui estabelecer-se, e desde então a vida e a propriedade existião entregues ao poder brutal de pequenos, mas crueis regulos, que dictavam a lei com a ponta do punhal, até que sendo sabedor disto o Governador Antonio de Albuquerque Coelho de Carvalho, veio e conseguio por termo a tão excepcional estado de coisas, submettendo o principal revoltoso, Manoel Nunes Vianna, portuguez activo, astuto e que sabia illudindo a todos, impôr a sua vontade de bronze.

(Extrahimos do livro da camara de Sabará o seguinte termo, que está um pouco em desarmonia com o que consta dos documentos que temos a vista  — Eis o termo — “Srs. do senado — Quando eu vi em minhas mãos o ofício que o dr. corregedor desta camara dirigio a este senado com a data de1785, e igualmente a ordem régia que nelle se contempla, eu me senti preocupado de um bem fundado receio de não poder cumprir com o respeitoso preceito que vai na dita ordem e que se me impõem e de passar por isso pela vergonhosa injúria de ser um vassalo inutil ao Estado, e a republica. Porém como ao mesmo tempo foi manifesto ao meu conhecimento  que as primeiras obrigações temporaes dos vassallos é prestar uma obediencia submissa na execução e cumprimento dos Mandados Regios ainda que muito embora perigue a própria reputação, por se dever antepor a esta a fidelidade, eu me dispuz logo para fazer uma indagação minuciosa das noticias e tradições que me servissem para formar o plano da relação que faz o objecto de minha comissão, e a força de um pouco de trabalho, gostosamente despendido, apenas pude individuar — Que arrogando Manoel de Borba Gato o título de Governador de Minas pelo previlegio de ter sido o descobridor dellas, unido Valentim Pedroso de Barro, e outros que havião subido da Capitania de S. Paulo, procedeu naquele despotico governo com um desvio total daquellas prudentes maximas, que devem ser inseparaveis da conducta, e da pessoa de quem tem a seu cargo semelhante regencia. E por isto fatigados os povos de soffrer involuntarios e pesados effeitos de um comportamento irregular desde o anno de 1698 até 1708, nelle elegerão com pluralidade de votos, para seu Chefe, com o título de capitão regente, a Manoel Nunes Vianna, homem branco e Européo. E aceitando elle a nomeação, e cargo arbitrariamente conferido por aquelles povos emprehendeu logo a expulsão dos paulistas do continente de Minas, e conseguindo indisputavelmente o dito empenho por força do grande auxilio de armas, com que foi socorrido de todos os habitantes do paiz que forçadamente soffrião e supportavão o entruso governo de Borba, continuou e permaneceu na dita regencia, até que por ordem da Côrte chegou a estas minas o Illm. e Exm. Antonio de Albuquerque Coelho de Carvalho a quem prompta e submissamente entregou a regencia e governo o dito Vianna, presando-lhe todos aquelles obsequios que são devidos a um talpersonagem como um verdadeiro delegado do Príncipe Soberano e Rei Nacional. Eu não individuo e faço relação de muitos factos acontecidos com os paulistas e Européos durante a regencia daquele Vianna, por que elles nada tem de memoráveis, antes serveria de escandalo e horror a posteridade fazer lembrados uns factos de que não é facil achar exemplos entre os povos de uma mesma nação, e vassalos de um mesmo Principe; pois para total horror de sua lembrança bastava serem demonstrativos da irreligião com que vivião os ditos individuos, porque preocupados somente da ambição e avaresa nem prestavão socorros ao proximo nas suas necessidades, nem reverenciavão a Deus como verdadeira e unica causa de todas as felicidades, e por isso é melhor que no silencio se occulte memorias tão vergonhosas.”

O que se segue no termo é tudo relativo ao Sabará e por isso não transcrevemos o resto.

Esta memória foi apresentada pelo Vereador Capitão Manoel Alves Carneiro a 23 de Outubro de 1786.


Publicado no “Almanack Mineiro
em 1864, na cidade de Ouro Preto
(respeitada a ortografia da época)