Testemunha
22ª
O
Reverendo Padre Manuel Rodrigues da Costa (que passaria também, em 1791, de
testemunha a réu. Nascido em 1744, faleceu em sua Fazenda do Registro Velho
(estação de Sá Cortes), tendo sido sepultado na capela do Santíssimo, na matriz
da Piedade de Barbacena, em 20 de janeiro de 1844. Durante seu exílio em
Portugal, viveu quatro anos na fortaleza de São Julião da Barra. Daí passou a
recluso (1796), no convento de São Francisco da Cidade, histórico edifício onde
funcionou até recentemente a Biblioteca Nacional de Lisboa. Em 1804 foi
relaxada a reclusão e libertado. Autorizado a voltar ao Brasil, fixou-se de
novo em sua fazenda. Teve atuação destacada no processo da Independência, tendo
sido eleito Deputado às Cortes Gerais de Lisboa, em 1821; solidário com os
companheiros da representação mineira, recusou-se a partir para Portugal.
Anfitrião imperial e amigo pessoal de D. Pedro I. Obteve expressivas votações
para membro da Junta Governativa Provisional de Minas, em 1822, e para Senador
do Império, em 1826. Fez parte da Assembléia Constituinte, onde se ocupou da
liberdade de culto e da catequese e colonização. Escreveu, ainda recluso no
convento de S. Francisco da cidade de Lisboa: 1 – “Tratado da Cultura dos
Pessegueiros – nova edição revista, corrigida e augmentada. Traduzida da língua
francesa por Manuel Rodrigues da Costa, presbítero do hábito de São Pedro e
natural de Minas Gerais. Lisboa. Na Tipografia Calcográfica e Literária do Arco
do Cego. MDCCCI. Por ordem superior”. No Brasil: 2 – “A Sua Alteza Real o
Príncipe Regente Constitucional, Defensor Perpétuo do Brasil. Pelo Padre Manuel
Rodrigues da Costa, morador na Vila de Barbacena, Comarca do Rio das Mortes,
Província de Minas Gerais. Rio de Janeiro, 1822. Na Oficina de Silva Porto
& Cia. (Sermão).” 3 – “Memória sobre a Catequese dos Índios, composta e
dirigida ao Ilmo. e Revmo. Sr. Cônego Januário da Cunha Barbosa, Primeiro
Secretário do Instituto Histórico e Geográfico, pelo Sócio Honorário o Pe.
Manuel Rodrigues da Costa. Em Agosto de 1840.” Cf. Alexandre Miranda Delgado,
“O Padre Manuel Rodrigues - Inconfidente
– Edição do Autor, 1962, págs. 69 a 77. Cf. Rubem Borba de Moraes,
“Bibliografia Brasileira do Período Colonial” – Instituto de Estudos
Brasileiros da USP, 1969.), natural da Freguesia de Carijós, Comarca do Rio das
Mortes, residente na Freguesia de Nossa Senhora da Piedade da Borda do Campo,
que vive de suas fazendas, de idade de trinta e cinco anos, testemunha a quem
ele, dito Ministro, deferiu o juramento dos Santos Evangelhos em um livro deles
em que pôs sua mão direita, sob cargo do qual lhe encarregou jurasse a verdade
do que soubesse e lhe fosse perguntado, o que assim prometeu cumprir como lhe
estava encarregado.
E
perguntado ele, testemunha, pelo conteúdo no Auto desta Devassa que todo lhe
foi lido, disse que pouco mais ou menos pelo tempo em que tinha chegado a esta
Capitania o Excelentíssimo Senhor General, lhe falara em certa ocasião o
Alferes do Regimento Pago Joaquim José da Silva, por alcunha o Tiradentes,
queixando-se-lhe amargamente dos Governadores destas Minas: que se achavam
assoladas e que já se faziam intoleráveis os seus despotismos, referindo mais
particularmente as suas queixas ao Excelentíssimo Senhor Luís da Cunha Meneses;
acrescentando que vinham aqui enriquecer e aos seus criados; e que este país
podia ser um Império; e que se achasse quem o ajudasse, havia de pô-lo livre da
sujeição da Europa, encarecendo as suas produções, maiormente de ouro e
diamantes. Ao que lhe respondeu ele, testemunha, observando a soltura com que o
dito Alferes falava, que semelhantes coisas nem pensar se deviam. E que por
este motivo, conhecendo a amizade que tinha o dito Tiradentes com o coronel
José Aires (coronel José Aires Gomes,
dono das fazendas da Borda do Campo e da Mantiqueira), ele testemunha o
procurou e lhe perguntou se já havia conversado com aquele Tiradentes, e ouvido
as suas liberdades; e respondendo-lhe o dito Coronel que já sabia disto, e que
o Senhor Visconde também o sabia porque lho tinha contado, ele Aires, se
admirou ele testemunha dizendo: “E o Senhor Visconde não providencia isso?” Ao
que lhe tornou o mesmo Coronel, acenando com a cabeça: “A seu tempo”.
Depois,
porém, que se fizeram as prisões do dito Tiradentes, Joaquim Silvério, Desembargador
Gonzaga, e os mais, é que ele testemunha tem ouvido geralmente falar de um
levante que se premeditava; e lhe ocorre que, passando o Coronel Joaquim
Silvério por casa dele testemunha em certa ocasião, lhe contara que esteve para
se lançar a derrama; porém que ele, conversando com Sua Excelência neste ponto,
ponderando-lhe o estado da terra e outras circunstâncias que lhe não declarou,
fez com que o mesmo Senhor mudasse de parecer e sobrestasse naquele
procedimento. Depois do que, passando o mesmo Silvério por casa também dele
testemunha, lhe contou que se dirigia para o Rio de Janeiro a buscar uma carta
de proteção do Excelentíssimo Senhor Vice-Rei para o Doutor Intendente e
Procurador da Real Fazenda, e que isso mesmo lhe mencionara o Senhor Visconde,
o que ele testemunha não acreditou; antes, juntando as notícias e passagens
referidas, assentou consigo que a ida daquele Joaquim Silvério ao Rio tinha
muitos diferentes fins; cuja ideia comunicou ele testemunha ao Padre José Lopes
de Oliveira, a quem o mesmo Silvério tinha também comunicado todo o referido, e
ambos convieram no mesmo juízo.
Declara
mais ele, testemunha, que quando foi a última vez que o dito Alferes passou
para o Rio de Janeiro, transitando por sua casa, lhe referiu incidentemente que
ia para o Rio de Janeiro a certa dependência de umas águas, sobre que lhe
mostrou uns despachos, e que ao mesmo tempo ia também cuidar naquele negócio em
que lhe tinha tocado quando viera para cima, relativo à liberdade da América;
ao que lhe respondeu ele, testemunha, que o demônio o andava tentando a fazer
algumas desordens que lhe haviam custar a cabeça. Também está certo que, ainda
antes das prisões, ouviu dizer, sem se lembrar de quem, que o Coronel Alvarenga
sabia daquela desordem. E mais não disse, nem dos costumes; e sendo lido o seu
juramento, o assinou com o dito Ministro; e eu, o Bacharel José Caetano César
Manitti, Escrivão nomeado, o escrevi.
Saldanha – Manuel Roiz
da Costa.